terça-feira, 6 de setembro de 2016

O Hino do Grêmio e a Memória

Coluna do Carlos Josias: Diretor Jurídico do Grêmio 93/98, Conselheiro 94/2010 e Vice-Presidente 2005/07











 
O texto que apresento abaixo não é meu. Mas é real. Com o pedido de manter os nomes em segredo, ao receber indaguei se podia publicar, tal a emoção que senti diante de tanto Gremismo. Foi escrito por um filho face episódio, recente, com seu pai, este acometido de enfermidade grave que lhe retirou a memória e o reconhecimento das pessoas.

18/08/2016
17:46


A vida nos apresenta questões difíceis de entendermos. O envelhecimento dos nossos pais, por exemplo, desencadeiam reflexões que viajam por nossa existência e terminam na dura tarefa de respeito pela força do tempo.
Sempre fui muito ligado ao meu pai. É o meu grande exemplo. Me ensinou tudo. Seu maior legado talvez tenha sido o respeito ao contraditório. Sempre gostou de conversa. Ouvia muito e falava com propriedade. Conhecia as pessoas e aceitava as diferenças. Uma doença difícil, dura, diminuiu a sua capacidade. Lutador, ele tem enfrentado com força o destino que traçaram pra ele.
Hoje, estive por horas ao seu lado. Só nós dois, como nos velhos tempos. A memória o trai atualmente. Ele não lembra quem eu sou. Ficamos sentados. Ele falava palavras desconexas, que, incrivelmente, foram ganhando um sentido. Tentei puxar assunto, mas não era comigo que ele falava.
Aos poucos, ele foi aumentando as palavras e cantarolou algo. Demorei a entender e fui me fixando naquilo. Ele seguia com o olhar longe, fixo, muito além daquele pequeno espaço que nos encontrávamos.
Ele seguiu cantarolando e achei familiar o que ele tentava dizer. Era o hino do Grêmio. Meu pai tentava cantar a eterna música de Lupicínio Rodrigues.
Comecei, então, a cantar o hino do Grêmio desde o início e ele, automaticamente, parou de tentar e me olhou fixo. Dentro dos meus olhos, ele sorriu lindamente. Segui, aos prantos, a cantar. Ele ficou calmo, seguiu sorrindo, e ajudava sempre que surgia a palavra GRÊMIO. Do jeito dele, quase imperceptível, mas um "Grêmio" do fundo de sua alma. Um Grêmio que não se esquece, nem que a memória já não consiga ajudá-lo.
A vida, como disse no início, nos coloca em situações complexas, difíceis, mas sempre nos ensina. No nosso mundo, as afinidades e as conexões das pessoas ganham contornos universais. O Grêmio foi sempre um assunto e um convívio importante na nossa relação. Pois na tarde de hoje, acamado e sem memória, o meu velho pai descobriu no Hino do Grêmio a forma de dizer que seguimos conectados e muito fortes.
Até a pé nós iremos,
Para o que der e vier
Mas o certo é que nós estaremos
Com o Grêmio onde o Grêmio estiver
Respeitem os seus amores, criem conexões, curtam o seu tempo e vivam a vida. E cantem, cantem muito.

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